O Flamengo que riu da Guerra e marcha para mais uma Final
Há jogos que ultrapassam o futebol.
Há partidas que se tornam capítulos de uma mitologia rubro-negra escrita à base de suor, injustiça e glória.
A semifinal contra o Racing, em Avellaneda, foi exatamente isso: um ato de resistência épica, daqueles que Nelson Rodrigues descreveria como “drama de santos e pecadores”, em que o Flamengo encarna o herói perseguido, mas jamais vencido.
Durante a semana, o técnico do Racing fez da provocação seu método.
Falou em “guerra”, em “vencer a qualquer custo”, flertou com o antijogo e com a grosseria esportiva, como se o futebol fosse um ringue e não um campo.
E, enquanto ele falava, o Flamengo trabalhava.
Jogava no Brasileirão, jogava na Libertadores, jogava pelo calendário mais cruel do continente.
Enquanto o Racing descansava, o Flamengo batalhava.
A diferença entre os dois não era apenas física, era moral.
Um teve descanso; o outro, caráter.
Mesmo assim, antes da bola rolar, a imprensa, essa eterna fábrica de teses apressadas, tentou inverter os papéis.
Fizeram do Flamengo um quase azarão, como se três Libertadores em cinco anos fossem acidente; como se vencer o primeiro jogo no Maracanã fosse detalhe; como se o time mais dominante do continente tivesse de se justificar por existir.
Ignoraram o peso da camisa, o tamanho da história, o fato inegável de que, quando o Flamengo chega, a América se curva.
E veio o jogo.
O clima de “guerra” prometido foi rapidamente desmistificado pela magia rubro-negra.
O campo de batalha anunciado transformou-se em território sagrado, onde o Flamengo, senhor de si e protetor de seus domínios, controlou o jogo com autoridade. Ignorou os torcedores do Racing que rugiam das arquibancadas e fez um primeiro tempo seguro, de domínio tático e alma tranquila.
Mas veio o segundo tempo, e com um erro ridículo da arbitragem e a injusta expulsão de Plata, a guerra que parecia ter sido evitada foi reacendida.
O que se viu a partir daí foi um Flamengo movido por algo maior que estratégia: a força invisível da Nação.
Empurrado por milhões, o time lutou até o fim, transformando cada minuto em batalha e cada dividida em símbolo da fé que move o Manto.
Com dez em campo, o time virou trincheira.
Jorginho, um general elegante.
Arrascaeta, o cérebro, enquanto o pulmão aguentou.
Pulgar, gladiador silencioso.
E, na defesa, um exército capitaneado por seu líder, Rossi, um verdadeiro paredão.
Cada dividida era um manifesto.
Cada minuto, uma prece.
O Racing se atirava como quem tenta derrubar um muro com sopros.
E o Flamengo, sereno e indomável, esperava o tempo passar, não para sobreviver, mas para provar que a grandeza não se mede em números de jogadores, e sim em litros de alma.
E tudo isso sob o comando sereno e iluminado de Filipe Luís, o homem que, em apenas um ano como técnico profissional, transformou o aprendizado de uma vida em sabedoria prática de campo. E com essa liderança tranquila e inabalável, que o time atravessou o caos de Avellaneda sem perder a cabeça nem o rumo da glória.
Quando o juiz apitou o fim, o placar mostrava 0 a 0, mas o resultado era monumental.
O Flamengo, outra vez, na final da Libertadores.
Três em cinco anos, uma marca que separa o eventual do eterno.
É o clube que vive onde poucos resistem, que ergue o padrão de excelência num continente acostumado à instabilidade.
E, no meio da festa, há espaço para a dor: a lembrança dos torcedores que se acidentaram a caminho do jogo. A vitória, de alguma forma, é também deles.
Porque o Flamengo não joga apenas por si, joga por quem acredita, por quem sofre, por quem veste o Manto e entende que ele é mais que uniforme: é destino.
Avellaneda tentou transformar o jogo em guerra. Conseguiu, e o Flamengo venceu a guerra com honra.
A mídia tentou diminuir. Falhou, e o Flamengo aumentou sua lenda.
Agora, o continente inteiro volta a olhar para o mesmo ponto no mapa: o Estádio Monumental, em Lima, o templo onde a glória veste vermelho e preto.
O Flamengo está, mais uma vez, onde pertence: na final da Libertadores.
E que venham todos, o time, a Nação, o Manto e a história.
Porque, quando o Flamengo decide, o continente inteiro se ajoelha.
Créditos: Marcelo Hallas



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